Fandango – Patrimônio Cultural Brasileiro

Fandango – Patrimônio Cultural Brasileiro

Quem em Cananéia nunca ouviu ou conhece um grupo de Fandango Caiçara? O que alguns não se dão conta, é que o Fandango não é apenas uma moda na rabeca ou uma dança sapateada, o Fandango é patrimônio cultural brasileiro e deve ser apreciado e preservado por todos.
A História
O Fandango Caiçara é encontrado atualmente no litoral norte do Paraná, litoral sul e litoral norte de São Paulo e também no litoral sul do Rio do Janeiro (onde pode ser conhecido também como Ciranda)
Ele está próximo ao modo simples de vida, pois assume e integra toda a vida da comunidade. É um divertimento, ligado à economia e em algumas situações tem relação com a religiosidade.
Antigamente, era comum a reunião de vizinhos para realizar determinado trabalho na roça, como plantio, colheita ou reparos numa casa, os chamados mutirões ou ajuntórios. O baile de Fandango era oferecido pelo dono do serviço, como forma de pagamento do trabalho realizado, cedendo sua casa e servindo comida e bebida aos convidados. Ali entravam e permaneciam apenas as pessoas que trabalharam durante o dia e algum convidado do dono da casa.
O Fandango era dançado também no entrudo (como era chamado o carnaval antigamente), nas noites que antecediam a quarta-feira de cinzas. Porém, a quaresma era respeitada, as violas desencordoadas e penduradas com a boca para a parede, simbolizando o luto (silêncio) que pede a igreja católica. O Fandango recomeçava no sábado de aleluia, sempre na última casa que fora dançado antes da quaresma.
Casamentos, aniversários, festas de santos padroeiros ou mesmo, simplesmente, querer dançar e brincar eram motivos para fazer Fandango, só era preciso convidar o povo das redondezas.
Comida não podia faltar, com pratos preparados à base de pescados, arroz, feijão e também alimentos a partir da farinha de mandioca, essencial na mesa caiçara, como bijus, cuscuz e broinha. Era servido também o barreado, prato à base de carne, feito na panela de barro e cozido por meio dia. Para acompanhar eram servidas frutas como banana e laranja e a comida regada a cachaças típicas da região como: a cataia (infusão de pinga com a planta cataia), a mãe com filha (pinga com melado de cana), o quentão de frutas ou a quira (feita a partir da fermentação do caldo de cana).
As músicas eram entoadas por dois violeiros e abordavam assuntos do cotidiano da vida desses caiçaras, como: amores, intrigas, realizações, trabalhos, aventuras, entre outros. A dança era puxada pelos cavalheiros, com seus tamancos feitos de madeira como a canela ou a laranjeira, batendo no assoalho de madeira, com sua dama à frente, realizando passos curtos, característico de cada música. Havia um total respeito ao dono da casa, aos mais velhos e às damas e se caso alguém estivesse se excedendo ou mesmo não agradando de algum modo, cabia ao violeiro inventar e cantar em versos dirigidos à pessoa para que ela moderasse o seu comportamento ou mesmo se retirasse da festa.
Assim era a convivência num Fandango, comunidade integrada com muita música, dança comida e amizade.
Os instrumentos
Os instrumentos usados no Fandango são a viola (artesanal fandangueira), o adufo (espécie de pandeiro), a rabeca (instrumento parecido com o violino), o machete (semelhante ao cavaquinho) e o bumbo ou outro instrumento parecido, como a caixa de folia.
São os próprios fandangueiros que confeccionam seus instrumentos. É necessário conhecer bem as madeiras, a mais utilizada é uma madeira mole, conhecida como caixeta (Tabebuia cassinoides). Além disso, é necessário observar a fase da lua para não fazer o corte nos meses que possuem a letra R, para que as madeiras não se deteriorem rapidamente. A cola que os antigos utilizavam era obtida do sumbarê, uma planta da qual extraia-se da raiz queimada. Fora as rezas e simpatias realizadas, para evitar o mau olhado e a inveja, males que “arruinariam” e estragariam a qualidade dos instrumentos.
Cada forma musical, definida pelos mestres violeiros, é chamada de marca ou moda e dependendo da região, possui toques e danças específicas, que se dividem basicamente em duas categorias: os valsados ou bailados – dançados em pares por homens e mulheres, com ou sem coreografias específicas – e os batidos ou rufados, no qual os homens utilizam tamancos feitos de madeira, intercalando palmas e tamanqueando no assoalho de madeira e as mulheres acompanham os dançadores em coreografias circulares, onde os pares vão traçando figuras, sendo a mais comum a de um oito, no sentido anti-horário.

Antigamente realizava-se a porfia, uma disputa para se eleger o melhor tocador ou cantador. Ela é feita também pelos batedores de tamancos, tendo ao vencedor o reconhecimento e respeito de todos durante o baile. A rivalidade entre as damas é para atrair a atenção dos cavalheiros para que as chamem para dançar.
É através de lendas que os costumes são mantidos por gerações, sempre com um final desastroso para quem desrespeitá-los. Como o caso de que se alguém dançasse Fandango na quaresma, iria morrer e viraria um pássaro com canto triste, o tangará.
O Fandango atualmente
Alguns costumes se perderam ao longo do tempo, devido ao crescimento urbano e tecnológico, restrições ambientais e também sendo proibidos por instituições religiosas.
No entanto, a partir de 1960, algumas pessoas se mobilizaram com o objetivo que salvaguardar a memória do Fandango, como o Grupo Folclórico Mestre Romão em Paranaguá e na década de 70, em Morretes, a professora Helmosa Salomão Richter organizou um grupo de Fandango com a inclusão de jovens entre os tradicionais fandangueiros.
Mas foi em meados dos anos 90 que houve um aumento no interesse acerca do Fandango, tanto para aprender a tocar e confeccionar os instrumentos, quanto para dançar as modas.
Em 2005 foi criado o Museu Vivo do Fandango nas cidades de Morretes, Paranaguá e Guaraqueçaba no Estado do Paraná e Cananéia e Iguape no Estado de São Paulo. Um museu sem sede, mas formado por um circuito de visitação que inclui casa de fandangueiros e construtores de instrumentos, associações ligadas à cultura caiçara, casas de fandango, pontos de cultura, museus e centros culturais, com o objetivo de preservar e fortalecer esse universo material e imaterial da cultura caiçara.
Atualmente existem jovens violeiros, rabequeiros e adufeiros, mestres de tamanqueado e bons cantadores, alguns até como líderes em suas comunidades, ensinando fandango nas escolas, dirigindo grupos, ministrando oficinas de construção de instrumentos. Junto aos mais velhos mantém o respeito pelo fandango tradicional.
O Fandango em Cananéia
O Fandango em Cananéia está em franco revigoramento e nos últimos anos passou por muitas transformações.
Em Cananéia existem vários grupos musicais, entre eles o grupo Violas de Ouro de São Paulo Bagre (o grupo mais antigo do Estado de São Paulo), o grupo Esperança, o grupo de dança Vida Feliz e o grupo de batido São Gonçalo.
Na comunidade do Marujá, localizada na Ilha do Cardoso, temos o grupo Família Neves e na comunidade caiçara do Ariri alguns fandangueiros, como os irmãos Pereira e a família Alves, por lá também são realizados alguns bailes e onde eventualmente são organizados mutirões. Já na área continental do município existem alguns fandangueiros, principalmente na comunidade do Mandira, Taquari, Porto Cubatão e arredores.
O município também se destaca pela variedade de formas de construção de instrumentos, feitos por Agostinho Gomes, João Firmino Dias, Lino Xavier, Nelson Franco, Arnaldo Pereira e José Pereira, e pela presença dos compositores que trabalham temas atuais nas letras de fandango como Paulinho Pereira, Ângelo Ramos e Valdemir Cordeiro.

Fonte: Guia Museu Vivo do Fandango
http://fandangoemcananeia.art.br/

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Kira Gordon

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